Com um subtexto humano e relacionável para os desafios de nosso mundo moderno, James Gunn mostra que com o simples dá para se fazer uma grande história.
Não havia alguém melhor do que o próprio James Gunn para escrever e dirigir a nova reimaginação do Superman para os dias de hoje. Para quem usa de dramas familiares e existenciais carregados de personagens que utilizam da música como válvula de escape para enfrentar as questões da vida, Gunn apresenta o Superman mais millenium que já vimos: aquele garoto que em algum momento da vida já passou por sua fase punk e se acha o descolado, mas que mesmo sendo um imigrante de outro planeta multipoderoso foi criado com muito amor por pessoas simples, veste o uniforme feito pela mãe e quer fazer a coisa certa. Não temos um “super herói”, temos aqui um amigo.
Quadrinhos sempre foram políticos e refletiam suas respectivas épocas, e aqui não é diferente. Estamos falando de uma narrativa que explora temas como imigração, dignidade e o medo do desconhecido, do que é de fora, seja na figura do Superman ou da nação oprimida por um país tirano lutando por um lugar para viver que vemos no filme. No meio de tudo isso junte Lex Luthor – Vivido de forma intensa por Nicholas Hoult – um mundo de heróis “enlatados” de grandes corporações e uma conspiração regida pelo ódio a fim de derrubar o homem de aço. Este é Superman (2025).
David Corensweet é a escolha perfeita para o papel. Sentimos verdade quando vemos seu personagem em tela, seja como Superman ou Clark Kent. É o cara que mesmo vivendo em um mundo onde deuses e monstros existam e fazer o bem tenha se tornado brega e datado – tal qual nosso mundo – se torna o ponto de virada e inspiração para aquela sociedade enxergar o seu potencial de fazer melhor e reconstruir o que a muito tempo tinham perdido. Potencial esse que não fica apenas em um espelho de nossa sociedade, mas também no resgate da reputação cinematográfica do personagem, perdida em tentativas falhas de tornar o personagem distante do público geral e muitas vezes visto como figura messiânica, desde O Homem de Aço (2013).
O filme toma a liberdade de ser fantasioso sem medo, nos apresentando monstros gigantes, universos de bolso e uma ficção científica cartunesca que cria uma identidade própria para o filme, se assemelhando quase como uma animação semanal da Liga da Justiça de estrutura episódica, acompanhado de uma cinematografia – Henry Braham: Guardiões da Galáxia, A Bússola de Ouro – cheia de inventividade, cor e movimentos de câmera que brincam com o real/imaginário. Isso é ruim? Pelo contrário, só torna a narrativa mais honesta com o gênero que está adaptando, que muitas vezes tentam ser o que não é.
Temos fortes relações entre cada um dos personagens. Rachel Brosnahan como Lois Lane entrega um show de química com o Clark Kent de Corensweet em um relacionamento que ainda está encontrando a sua definição, enquanto temos o contraponto Lex Luthor (Nicholas Hoult) que é pura inveja, ódio ao personagem principal e funciona muito bem como um espelho do que podemos definir como o “hater de internet” que usa de seu dinheiro e poder para alimentar o ciclo de ódio virtual e social em nosso mundo.
Por mais que o filme tenha muitas coisas boas, um padrão que muitas vezes acompanha a direção dos filmes de Gunn é que o diretor acaba perdendo a mão no texto em que escreve em algum momento, assim como em seu último – e ótimo – Guardiões da Galáxia; Filmes com uma narrativa sólida e com algo a dizer, mas que o excesso de momentos “quebra de gelo” fora de lugar e timing vão deixando a narrativa difícil de se conectar, além de fazer uma mudança na história do personagem que da maneira que é representada no filme, beira uma escrita pobre, em comparação com outras obras carregadas de sentimento que o diretor escreveu com excito.
No fim do dia, Superman acaba não sendo o filme perfeito do personagem, mas o que ele precisava após anos de maus tratos nas mãos de seu próprio estúdio. Um filme que precisávamos para os dias de hoje, uma obra honesta com seu gênero e os temas que retrata, ao mesmo tempo em que reflete temas e conflitos atuais de nossa sociedade, nos convidando a sermos “punks” em uma sociedade cinzenta e abraçarmos a gentileza uns com os outros a fim de construir um amanhã melhor.
Superman está atualmente em cartaz nos cinemas de todo o Brasil.